25 junho 2025

Sakura

 

Lembras de ti?

Aos findos dias do inverno, enxia-se de botões em cores carmins.

Os transeuntes vislumbravam e ansiavam pelo espetáculo que viria.

O frio cortante, não lhe abalava e seguias firme, frondosa, esbelta.

 

O estilhaçar dos brincos gélidos ao fim da estação,

Era o soar da beleza vindoura, presenteando deusa menina.

Desabrochavas, uma a uma, cada botão era em si, único.

Em buquê tornava-se, espetacular e delicada.

 

Invejosos infortúnios derrubaram-te.

Ao chão, suas pétalas vibrantes secaram e esqueceu-se de como eras.

Como pode a vida, de tal maneira, destruir tua formosura?

Esquecestes de presentear a ti mesma.

Ora! Maior deleite é aquele onde nos embebedamos de nós mesmos.

Em carne viva despia-se de máscaras e mentiras

Sob o sol, vibrava e enflorava, trazendo para fora sua natureza!

 

Divina deusa da roda da vida,

Abençoa, pois esta criança, que desvanece e despreza teu cerne.

A relembre da pureza de suas cores e da delicadeza com que encantava toda gente.

Que ouças, meu pedido e dos demais que por este ser intercedem.

 

Sakura,

Que encontres a cerejeira adormecida em ti,

E como ela, floresça, renove-se, mostre-se.

Após teu longo inverno, que ponhas afora sua graça

E encante a ti mesma uma vez mais.

T. Alves




09 junho 2025

Aihpos

 Talvez...?


Não!


Me enganei,

em verdade,

me vi como Ícaro, e despenquei dos céus.


Ainda me pergunto por que me importo?

É só mais uma perda.


Enxergo mil coisas e ainda assim não sei descrevê-las.

Aonde devo ir?


Perdão, nobre senhora,

talvez tenha sido eu,

demasiado vão.

Acreditei na doçura do saber que de fato, é,

tão doce quanto é fel.


Seria eu, adúltera,

merecedora das pedras ou és tu,

implacável algoz?


Nada se conecta, não é?


O mundo gira, os dias passam,

e ainda me embriago com palavras abstratas e dançantes.


Perdão!


Me silenciarei,

antes que insulte (vossa) Sophia.


T. Alves




17 maio 2025

Ókèèrè

 Ainda verto, veneno e lágrimas

ambos meus, ambos me enlouquecem.

Enquanto as risadas me embalam, louca,

agonizo esperanças perante a noite escura.

Os pedidos às estrelas são esperanças mortas num coração tolo,

ainda assim, conto cada uma delas

quem sabe, elas me ouvem

ou a Lua se apiede e venha dançar.

Os ventos cantam,

a fogueira trepida e narra histórias,

a noite caminha e clareia.

Ao amanhecer, esqueço das lamúrias e finjo alegrias.

Meus ossos doem, meu sangue ferve,

a luz me lembra do que se oculta.

Será que o sol curaria minhas chagas?

As brasas, ao se apagarem, me retornam a mim,

sempre vivo e sempre no fim.

O senhor do sopro, sempre me lembra de caminhar,

às vezes, não creio ser possível,

e na maioria, acompanho fagulhas e rego sementes.

A vida, que não me pertence, é bela e irregular.

Então, bebo mais um gole,

observo nuvens e me banho em chuvas.

Sabe, ainda rezo.

Me lembrei das palavras de uma flor, hoje adormecida,

que a vida escorre pelas mãos como areia.

Não pode ser presa, não pode ser igual,

cada grão, remonta o todo.

Ainda penso, ainda sinto, ainda espero.

Enquanto o orvalho serenado me acalenta.

T. Alves





25 abril 2025

23

Eu perdi outro nascer do sol.

Eu perdi outro banho de chuva.

Eu perdi o sorriso infantil.

Eu perdi o medo do escuro.

 

Abracei meus demônios.

Engoli meus anjos.

Desenterrei meus pecados.

Enterrei meus sonhos.

 

Eu corri quando deveria andar.

Eu parei quando deveria voar.

Me ajoelhei quando deveria estar de pé

Eu perdi o que nem havia ganhado.

 

Eu aprendi ou insisto no ciclo?

 

Eu ouvi vozes mudas.

Eu vi o invisível.

Eu lembrei do que não era meu.

 

Não desejo flores em meu funeral,

Ou velas me guiando a um caminho além.

Antes da pá de cal, me levantarei

Antes de sucumbir aos vermes, de novo, tentarei

Antes de voltar, irei.

 

Antes de fechar os olhos, os abrirei.

T. Alves



09 abril 2025

22

 

Não deveria, mas ainda importo-me.

Ou seria mera curiosidade?

Como me pintas hoje?

Quais aquarelas usa ao descrever-me?

Talvez, com os olhos de rapina,

Ou quem sabe, os fechastes demasiado.

Como poderias ver vendado e encoberto pelas lamúrias e dores?

Pelas verdades que ouviras tu, de outras bocas,

Ou a tua mesma tem dito aquilo que queres acreditar?

Pois, não saberia eu dizer-te, não enxergo ou penso como ontem.

Tenho me sentado à mesa com o Tempo,

Aguardando que sua medicina ponha efeito às feridas.

A vida me contou uma vez, que se diverte com os humanos

Mesmo tendo-a em mãos, como um jarro cheio de água fresca, escolhemos turvá-la ou derramá-la.

Pergunto-me, todos os dias, o que tenho feito de meu jarro?

Perguntastes a ti, o que tem feito do teu?


T.Alves



20 março 2025

Ator

 

Eu vi mil faces do abismo

Mil vezes escondi-me de mim

Mil faces me olharam de volta,

E outras mil vezes as vi.

 

Sonhos e pesadelos? Homônimos

Raízes secas entrelaçadas em minha mente

A cada poça de suor, uma nova história.

Será possível adormecer em paz?

Quantas vezes ainda contarei os tic-tacs do relógio?

 

Na madrugada, mil vozes me atormentam,

Mil olhos me julgam,

Mil vezes me destruo.

 

Qual a culpa do inocente?

Nascido vivo, morto ao crescer.

 

O que plantar em solos áridos?

Como regar a dor sem mágoa?

Pra onde ir, se não há estrada?

 

Eu assisti à borboleta alçar voo

Indo para longe, desenhando seu caminho

E senti inveja da sua liberdade.

T.Alves



29 janeiro 2025

21

Por vezes, me banho em águas escuras. 

Hora quentes como brasa viva incandescente, hora gélidas. 

Em todas, o torpor me atinge.

Quanto mais fundo, mais instigante

Já sentistes prazer na dor?

Estranho notar, mas quanto mais se fere, mais sangra, mais doi, mais êxtase.

Ainda assim, mergulho, me afundo.

Busco as pedras preciosas escondidas no abismo.

Ocasionalmente, me afogo, bóio, volto a margem e ao despertar, mergulho novamente, sempre mais fundo.

Visito meus lugares sórdidos e piso nos cacos. 

Mesmo havendo um paraíso a minha disposição, 

Escolho me perder na escuridão, para me lembrar o quão preciosa é a luz que tenho agora.

Luz que me aguarda, às portas do alvorecer.


T. Alves



24 janeiro 2025

Retrato

 As verdades são muitas, uma para cada universo.


Talvez eu não tenha lhe reconhecido

Quando despido, assemelháva-se a algo dúbio

Tão fraco e patético, quanto forte e vigoroso.

Ainda tens sede de sofia? Ou é por pura vaidade?

 - Ora, não seríamos todos dúbios?

Ao menos, em sua maioria, humanos o são. 

Mesmo partidos em três, permanecem como dois.

Já vistes, como sendo três, em um, pode-se despedaçar-se em vários?

Imagine três mundos como cacos tortos e afiados, misturados e idênticos

Como remontá-los, uma vez que uma parte não se une a outra?


Seria possível reverter a própria ruína?


Um dia, a Bruxa me disse:

 - Derreta e faça um novo. 

Nada resiste ao fogo, ele é o pai do renascer.


E no final, era apenas eu, contemplando meu reflexo num espelho partido.


T. Alves



20 janeiro 2025

20

 Já faz tempo e ainda dói.

Não verterei palavras sobre a profundidade do âmago adoecido,

Ou do quão aflitivo é.

Dizem que tudo passa.

A Iroko, pedi sabedoria para entender sua passagem.

A mim, pedi calma e temperança.

 

Endereço esta carta para alguém que fui.

Uma parte inocente, que se travestia de culpa e dúvida,

Tornou-se a cobra peçonhenta em alguns contos.

 

Embebedei-me de mim?

Talvez tenha me enganado com dissabores de outrem.

Palavras são como flechas, disseram. E ações? Ou a falta delas?

 

Turva água que brota no recanto escuro da alma

Fétida, pútrida e bela.

Perversos são seus olhos.

Não há alma enegrecida que não habite um ponto de luz.

Não há flor que não desabroche perante o sol.

Não há dor que persista diante do Tempo.


T. Alves



08 novembro 2024

Ijí

São tempestades que nos movimentam

aquelas, que nos reviram do avesso,

que nos descoram, nos destroem e nos inundam.


Só, enclausurada no olho do furacão,

ouvindo o sibilar dos ventos, 

as gotas tempestuosas que caíam feito agulhas,

rasgada em mil partes, me vi nua. 

Despida de prazeres, 

sentimentos, posses.


A cor enegrecida das nuvens me lembraram da minha própria escuridão.

Os raios e trovões, eram os gritos que calei em mim;

e cada lágrima que prendi, me atulhou.


Prostrada, ouvi de linda moça:

- Até quando sucumbirás à tempestade, ao revés que tu és uma? Até quando ajoelharás e darás a nuca de bom grado ao carrasco?  Até quando, filha minha, negarás teu eu e curvarás às podres almas que lhe oprimem? 

Por todos os ciclos lhe acompanhei, lhe guiei e lhe acudi o pranto. Alce voo, criança, nunca estivestes só, somos muitos, e somos seus.


Então, me ergui e segui.


T. Alves