29 janeiro 2025

21

Por vezes, me banho em águas escuras. 

Hora quentes como brasa viva incandescente, hora gélidas. 

Em todas, o torpor me atinge.

Quanto mais fundo, mais instigante

Já sentistes prazer na dor?

Estranho notar, mas quanto mais se fere, mais sangra, mais doi, mais êxtase.

Ainda assim, mergulho, me afundo.

Busco as pedras preciosas escondidas no abismo.

Ocasionalmente, me afogo, bóio, volto a margem e ao despertar, mergulho novamente, sempre mais fundo.

Visito meus lugares sórdidos e piso nos cacos. 

Mesmo havendo um paraíso a minha disposição, 

Escolho me perder na escuridão, para me lembrar o quão preciosa é a luz que tenho agora.

Luz que me aguarda, às portas do alvorecer.


T. Alves



24 janeiro 2025

Retrato

 As verdades são muitas, uma para cada universo.


Talvez eu não tenha lhe reconhecido

Quando despido, assemelháva-se a algo dúbio

Tão fraco e patético, quanto forte e vigoroso.

Ainda tens sede de sofia? Ou é por pura vaidade?

 - Ora, não seríamos todos dúbios?

Ao menos, em sua maioria, humanos o são. 

Mesmo partidos em três, permanecem como dois.

Já vistes, como sendo três, em um, pode-se despedaçar-se em vários?

Imagine três mundos como cacos tortos e afiados, misturados e idênticos

Como remontá-los, uma vez que uma parte não se une a outra?


Seria possível reverter a própria ruína?


Um dia, a Bruxa me disse:

 - Derreta e faça um novo. 

Nada resiste ao fogo, ele é o pai do renascer.


E no final, era apenas eu, contemplando meu reflexo num espelho partido.


T. Alves



20 janeiro 2025

20

 Já faz tempo e ainda dói.

Não verterei palavras sobre a profundidade do âmago adoecido,

Ou do quão aflitivo é.

Dizem que tudo passa.

A Iroko, pedi sabedoria para entender sua passagem.

A mim, pedi calma e temperança.

 

Endereço esta carta para alguém que fui.

Uma parte inocente, que se travestia de culpa e dúvida,

Tornou-se a cobra peçonhenta em alguns contos.

 

Embebedei-me de mim?

Talvez tenha me enganado com dissabores de outrem.

Palavras são como flechas, disseram. E ações? Ou a falta delas?

 

Turva água que brota no recanto escuro da alma

Fétida, pútrida e bela.

Perversos são seus olhos.

Não há alma enegrecida que não habite um ponto de luz.

Não há flor que não desabroche perante o sol.

Não há dor que persista diante do Tempo.


T. Alves



08 novembro 2024

Ijí

São tempestades que nos movimentam

aquelas, que nos reviram do avesso,

que nos descoram, nos destroem e nos inundam.


Só, enclausurada no olho do furacão,

ouvindo o sibilar dos ventos, 

as gotas tempestuosas que caíam feito agulhas,

rasgada em mil partes, me vi nua. 

Despida de prazeres, 

sentimentos, posses.


A cor enegrecida das nuvens me lembraram da minha própria escuridão.

Os raios e trovões, eram os gritos que calei em mim;

e cada lágrima que prendi, me atulhou.


Prostrada, ouvi de linda moça:

- Até quando sucumbirás à tempestade, ao revés que tu és uma? Até quando ajoelharás e darás a nuca de bom grado ao carrasco?  Até quando, filha minha, negarás teu eu e curvarás às podres almas que lhe oprimem? 

Por todos os ciclos lhe acompanhei, lhe guiei e lhe acudi o pranto. Alce voo, criança, nunca estivestes só, somos muitos, e somos seus.


Então, me ergui e segui.


T. Alves





01 novembro 2024

19

Queimem!

Malditas bruxas que assolam meu vilarejo!


Malditas são as palavras de sua boca!

Queimam como veneno e brasa. 

Escorrem pelo canto da boca, dilaceram a carne, o ser.


O lorde ordena! Queimem!


Ora meu senhor, não eras tu que se deliciava na mata?

Nas noites de Lua, uivava como licantropo,

nos campos, se esfregava à terra. 

Se embebedava com a chuva e os rios tortuosos.

Agora, santo és? Nega tua própria alma?


Crepita o fogo, ilumina a noite,

mais forte e mais belo,

mais voraz e faminto.

Queimo eu, filha da Luxúria e da boca deletéria.

Filha das deusas e do homem funesto.

Queimo eu, a bel prazer de raça corja.


Deleitem-se com o espetáculo!


Minhas cinzas passearão com os ventos,

as tempestades me unirão à mãe.

A justiça que rogo, vem à galope.

E dor das chamas lhe sugará

a alma imunda.


Eu, retornarei em alguns dias,

meu espírito é imortal, minha fé é perene.

Tomarei para mim o que me deves,

dançarei sem medo acima dos ataúdes,

e rirei de seu argueiro. 


Reverdeça!

T. Alves



18 outubro 2024

+18

 Boca, 

dedos, 

língua, 

tesão.

Tapas, 

gemidos 

suor.


Derrame teu mel no meu leito,

Derreta, 

se inverta, 

levante, 

sobe, 

desce.

Sacie minha sede com tua água.

Afogue-me!


Mãos e pernas trêmulas.

O frenesi que sufoca, 

deleita-mo-nos!


Assisto estrelas, lugares, vidas 

Nós. 


Jamais imaginei que ao tocares meu corpo, também adentrarias minh'alma.

Apenas tu chegastes tão longe,

e tão perto,

de mim.


Finalmente,


Não sou só carne!


T. Alves



Pandora

 

Semelhante à deusa, tens os dons guardados numa caixa?

Veste-se como prateada Lua?

Usa de palavras como facas afiadas, ou embebeda os homens como vinho?

 

Quiçá, serias tu, a tal guardada por Kore no submundo.

Parece-me mais provável, já que detinhas os segredos da beleza eterna.

Não a beleza venerada pelos entes, mas a guardada na alma,

a doçura da inocência, o riso alegre da dança, da poesia, da vida.

 

Viajas entre mundos, em busca de união.

Grande fardo carregas ao ser parte de um todo.

Os homens, a amordaçaram,

Teu eu despedaçado, a ponto de restar poeira.

 

Pois digo-lhe, formoso ser,

Darei eu, parte minha, para que do pó sejas barro, do barro se faça o novo.

Darei a ti a força para ressurgires.

Abra-se novamente, revele ao mundo o que guardas,

Não o mundo vil, mas àquele, de bom grado e coração.

 

Saúdo a ti, Pandora.

Me concederias nova dança?


T. Alves




16 outubro 2024

17

Afogado em lamúrias e dor, se revestiu de mágoas e palavras. Elas falavam mais de ti do que de outrem. 

Eu, guardei seu corpo frio nos braços de Gaia, para que algum amor lhe tocasse, como mãe, ela não distingue santos de pecadores, apenas os ama.

Em mim, enterrei fundo as mágoas, fingi alegria engolindo lágrimas e ainda assim, não fui suficiente.

Hoje, debato com os mortos sobre a vida, quiçá infinita, cíclica, finda. 

Se acordei meus infortúnios, quero rever o contrato. 


T.Alves




10 agosto 2024

Ponto Final

Era uma vez um amor eterno

Com promessas e música,

Desejos,

Sorrisos e lágrimas.


Era uma vez uma história bonita,

Porém, a rosa despetalou, 

O cravo chorou,

E a morada ruiu.


E ao fechar os olhos, a escuridão se fez.

Ao fechar dos olhos, tudo ficou bem. 


Então,

Entulhos formam novo alicerce,

Pétalas, adubam,

E o amor, um ponto final.


Re-comece.

T. Alves




15 julho 2024

16

Estou bem.

Dancei por horas, fingindo felicidade.

Por cima dos cacos, ignorei minha dor

Sonhei acordada e fui engolida por pesadelos

O escárnio riu de minha tolice,

Estou bem.

Desejei o descanso,

O perfume das rosas e a pá de cal.

Desejei lágrimas que não fossem minhas, 

E orações que me levassem a Luz.


Recolhi meus cacos, os colei com meu sangue, me refiz.


Honestamente, 

estou bem

Eu estou bem (?)

Sim, estou bem.


Adeus. 


T. Alves