08 novembro 2024

Ijí

São tempestades que nos movimentam

aquelas, que nos reviram do avesso,

que nos descoram, nos destroem e nos inundam.


Só, enclausurada no olho do furacão,

ouvindo o sibilar dos ventos, 

as gotas tempestuosas que caíam feito agulhas,

rasgada em mil partes, me vi nua. 

Despida de prazeres, 

sentimentos, posses.


A cor enegrecida das nuvens me lembraram da minha própria escuridão.

Os raios e trovões, eram os gritos que calei em mim;

e cada lágrima que prendi, me atulhou.


Prostrada, ouvi de linda moça:

- Até quando sucumbirás à tempestade, ao revés que tu és uma? Até quando ajoelharás e darás a nuca de bom grado ao carrasco?  Até quando, filha minha, negarás teu eu e curvarás às podres almas que lhe oprimem? 

Por todos os ciclos lhe acompanhei, lhe guiei e lhe acudi o pranto. Alce voo, criança, nunca estivestes só, somos muitos, e somos seus.


Então, me ergui e segui.


T. Alves





01 novembro 2024

19

Queimem!

Malditas bruxas que assolam meu vilarejo!


Malditas são as palavras de sua boca!

Queimam como veneno e brasa. 

Escorrem pelo canto da boca, dilaceram a carne, o ser.


O lorde ordena! Queimem!


Ora meu senhor, não eras tu que se deliciava na mata?

Nas noites de Lua, uivava como licantropo,

nos campos, se esfregava à terra. 

Se embebedava com a chuva e os rios tortuosos.

Agora, santo és? Nega tua própria alma?


Crepita o fogo, ilumina a noite,

mais forte e mais belo,

mais voraz e faminto.

Queimo eu, filha da Luxúria e da boca deletéria.

Filha das deusas e do homem funesto.

Queimo eu, a bel prazer de raça corja.


Deleitem-se com o espetáculo!


Minhas cinzas passearão com os ventos,

as tempestades me unirão à mãe.

A justiça que rogo, vem à galope.

E dor das chamas lhe sugará

a alma imunda.


Eu, retornarei em alguns dias,

meu espírito é imortal, minha fé é perene.

Tomarei para mim o que me deves,

dançarei sem medo acima dos ataúdes,

e rirei de seu argueiro. 


Reverdeça!

T. Alves



18 outubro 2024

+18

 Boca, 

dedos, 

língua, 

tesão.

Tapas, 

gemidos 

suor.


Derrame teu mel no meu leito,

Derreta, 

se inverta, 

levante, 

sobe, 

desce.

Sacie minha sede com tua água.

Afogue-me!


Mãos e pernas trêmulas.

O frenesi que sufoca, 

deleita-mo-nos!


Assisto estrelas, lugares, vidas 

Nós. 


Jamais imaginei que ao tocares meu corpo, também adentrarias minh'alma.

Apenas tu chegastes tão longe,

e tão perto,

de mim.


Finalmente,


Não sou só carne!


T. Alves



Pandora

 

Semelhante à deusa, tens os dons guardados numa caixa?

Veste-se como prateada Lua?

Usa de palavras como facas afiadas, ou embebeda os homens como vinho?

 

Quiçá, serias tu, a tal guardada por Kore no submundo.

Parece-me mais provável, já que detinhas os segredos da beleza eterna.

Não a beleza venerada pelos entes, mas a guardada na alma,

a doçura da inocência, o riso alegre da dança, da poesia, da vida.

 

Viajas entre mundos, em busca de união.

Grande fardo carregas ao ser parte de um todo.

Os homens, a amordaçaram,

Teu eu despedaçado, a ponto de restar poeira.

 

Pois digo-lhe, formoso ser,

Darei eu, parte minha, para que do pó sejas barro, do barro se faça o novo.

Darei a ti a força para ressurgires.

Abra-se novamente, revele ao mundo o que guardas,

Não o mundo vil, mas àquele, de bom grado e coração.

 

Saúdo a ti, Pandora.

Me concederias nova dança?


T. Alves




16 outubro 2024

17

Afogado em lamúrias e dor, se revestiu de mágoas e palavras. Elas falavam mais de ti do que de outrem. 

Eu, guardei seu corpo frio nos braços de Gaia, para que algum amor lhe tocasse, como mãe, ela não distingue santos de pecadores, apenas os ama.

Em mim, enterrei fundo as mágoas, fingi alegria engolindo lágrimas e ainda assim, não fui suficiente.

Hoje, debato com os mortos sobre a vida, quiçá infinita, cíclica, finda. 

Se acordei meus infortúnios, quero rever o contrato. 


T.Alves




10 agosto 2024

Ponto Final

Era uma vez um amor eterno

Com promessas e música,

Desejos,

Sorrisos e lágrimas.


Era uma vez uma história bonita,

Porém, a rosa despetalou, 

O cravo chorou,

E a morada ruiu.


E ao fechar os olhos, a escuridão se fez.

Ao fechar dos olhos, tudo ficou bem. 


Então,

Entulhos formam novo alicerce,

Pétalas, adubam,

E o amor, um ponto final.


Re-comece.

T. Alves




15 julho 2024

16

Estou bem.

Dancei por horas, fingindo felicidade.

Por cima dos cacos, ignorei minha dor

Sonhei acordada e fui engolida por pesadelos

O escárnio riu de minha tolice,

Estou bem.

Desejei o descanso,

O perfume das rosas e a pá de cal.

Desejei lágrimas que não fossem minhas, 

E orações que me levassem a Luz.


Recolhi meus cacos, os colei com meu sangue, me refiz.


Honestamente, 

estou bem

Eu estou bem (?)

Sim, estou bem.


Adeus. 


T. Alves



07 maio 2024

Jung

Em disforia, não se viu.

Calou-se, padeceu.

Em gaiolas de ferro, afogava-se em alto mar,

Ouvia gritos, sentia o ódio alheio, por ser.

Lembra-te niño, a mãe te guarda.

Não há gaiolas, nem mar que o cubra,

Ou raiva do mundo que te atinjas.

A mãe te guia, o pai te protege.

Somos um, e não somos sós.


T.Alves




23 abril 2024

Ao bardo

Não me fites.

Tenho me esvaziado aos poucos,

Em lágrimas secas e prantos mudos.

Quem sabe não seja melhor uma casca vazia?

Já que me derramei, tal qual um rio, em dias de chuva.


Talvez eu ainda espere alguma migalha,

Uma sombra qualquer de um passado doce,

Onde maçãs mordidas enebriavam corpos e corações.


Agora, o vinho é seco e amargo,

Já não me entorpece, nem me diverte

Não há brilho enluarado que me afague,

Ou calor solar que me aqueça.


Talvez, volte eu a debulhar-me em papel,

Para calar o grito e a desesperança de um vazio infinito. 


T. Alves





10 abril 2024

A voz do Papa

Porquê me olhas? Não lhe reconheço.

Se deságuas, Imperatriz, não me importo.

Vendado viajo mil léguas, e a outras mil retorno.

Ao início, estagnado

Quem serías tú? Porquê me anseias? Por quê jubila-se perante mim?

Afasta-te, cão, injuriado demônio!

Pois teu cerne não me cabe.

Aos meus devaneios me entrego.

A ti? Que se perca no vazio.


As cobras sempre mordem no mesmo lugar.



T. Alves




08 abril 2024

Ponto e vírgula


À vida. Há vida?

Esmagado por seus infortúnios,

Quebrado por suas memórias,

Dilacerou a si, à beira do abismo

A escuridão que vias, lhe engolira.

A culpa, a raiva, a dor, quantas mais vozes gritavam em ti?

Quantas vezes calaste a tua?

Eu vejo você.

Ainda não é tempo de pontos finais e mesmo exausto das vírgulas, continue

Nós vemos você;


T. Alves




07 março 2024

15


Eu vi o sol brilhar novamente 

E não acreditei que fosse para mim

Invisível diante do espelho

Me perdi ou me esqueci de quem era

Andei em círculos, acreditei

Quem sou, se não minhas memórias?

Que memórias?

Quem é você?

Quem somos nós?


Abri os olhos, e só vi suas lágrimas. 



Perdão. 



T.Alves




16 fevereiro 2024

Ayaba


Ríos negros, 

riachos, 

cascatas

Desenrolam-se e tornam a enrolar-se.


Brilham como ouro, 

reluzem à luz,

 são revoltos!

 

Rebeldes, emolduram a beleza pura!


O que seria de nós, 

meros mortais,

se não nos entrelessásemos

 em suas curvas?

 

 Pergunto-me, 

seriam rios ou coroas,  

os cachos que despencam de tua cabeça?


T. Alves